Capítulo 1: A outra maçã

O ensino médio não costuma ser complicado para quem é popular. Meus avós paternos eram donos de uma linha de supermercados famosa na região. E quando você é rico, por consequência se torna popular. Não que isso seja uma coisa legal. 
Meus amigos não eram os mais inteligentes da escola, mas eram os mais influentes. Camila estava tentando a carreira de modelo e sem dúvida era uma das meninas mais bonitas que já conheci. Marcus e David eram do time de vôlei da cidade. Jonathan era nadador profissional. E Anna era só rica mesmo. 
Eu era a querida dos professores. A pessoa que geralmente competia em nome da escola nos torneios de ciências. Talvez se eu não fosse rica não seria popular, pois não era modelo e gostava de estudar. Mas, não... Eu era Caroline Bittencourt, neta do Senhor e Senhora Bittencourt. 
Era o dia em que meu pai iria me buscar. Eu passava os dois últimos fins de semana do mês com ele. Sarah ficava os dois primeiros. Meu grupo já tinha ido embora, mas Jonathan sempre esperava comigo. Ele ainda acreditava que um dia poderíamos ficar juntos, embora eu deixasse claro que isso era algo bem improvável de acontecer. Mesmo assim continuávamos bons amigos. Sem dúvida ele era o melhor amigo que eu poderia ter. Jonny, como costumávamos chamá-lo, sempre tinha uma frase para alegrar o dia de todos. E ele era a única pessoa do grupo com quem eu podia compartilhar meus problemas sem ser motivo de zoação. 
Quando meu pai chegou, Jonny o cumprimentou com o mesmo “Boa tarde, senhor!” de sempre. Meu pai respondeu de dentro do carro:
─ Quantas vezes vou ter que pedir para me chamar de Vitor, filho?
Jonathan sorriu. Despedi-me dele e entrei no carro. 
─ Tchau, senhor Bittencourt! – Jonny gritou enquanto o carro se distanciava. Meu pai buzinou em resposta.


***


A casa de meu pai ficava em uma cidade não muito distante do bairro onde mamãe morava. Porém, era muito mais verde e linda, devo acrescentar, pois de fato era estonteante entrar nela. Depois que conheceu Clara, papai se casou e rapidamente mudou de cidade. A casa era “pequena”, segundo os padrões de Clara, que insistiu para que fosse uma irmã por vez nos finais de semana. Talvez ela tenha feito isso porque quando estávamos juntas, Sarah e eu fazíamos de tudo para deixar os cabelos de Clara em pé. Portanto o fato de não ter minha irmã por perto fazia com que as chances de ter um final de semana legal diminuíssem 100%.
Nenhuma palavra fora dita durante o caminho. Depois que ele se casou novamente, nossa relação ficou mais complicada. Nem tanto pelo fato do casamento, mas pelo fato da rapidez com que ele aconteceu. Nós ainda nem tínhamos superado a separação quando o convite chegou. 
Quando estávamos a apenas alguns minutos do nosso destino, ele finalmente quebrou o silêncio:
─ Garoto legal, aquele seu amigo.
─ É – respondi – você já falou isso várias vezes.
─ Vocês estão, tipo, namorando? 
Instantaneamente senti o meu rosto queimar. Não por eu sentir alguma coisa por Jonny, mas por meu pai achar que eu sentia. 
─ Claro que não! Somos só amigos.
─ Eu costumava ser só amigo da sua mãe quando eu tinha sua idade e ela acabou ficando grávida de você. 
─ PAI! – gritei totalmente envergonhada. Se essa era uma daquelas conversas de pai e filha, esse com certeza não era o momento. 
Como se fosse a coisa mais engraçada do mundo, meu pai soltou uma gargalhada ensurdecedora. O que me fez questionar se aquilo era sério, ou se era apenas uma brincadeira dele. Mesmo que fosse brincadeira, eu não tinha gostado.
─ Não tem graça – falei emburrada.
Ele sorriu. 
─ Você é jovem filha, precisa se apaixonar.
─ Eu e o Jonathan somos APENAS amigos.
─ Tudo bem, eu não estava falando que você precisa se apaixonar por ele. Só falei que você precisa se apaixonar – ele respondeu com uma naturalidade que me deixou ainda mais irritada. Eu nunca tinha me apaixonado de verdade, mesmo assim, não precisava que meu pai falasse isso.
─ Talvez... Mas não vou me apaixonar tão cedo.
Meu pai estacionou na garagem da casa. Enquanto o carro desligava, respondeu com um sorriso no rosto: 
─ Em pouco tempo, eu tenho certeza que esse seu pensamento vai mudar. 
De inicio não acreditei, mas ele estava certo.

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